quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

[conto #039] A Menina que Seguia o Sol

A MENINA QUE SEGUIA O SOL

Há muito tempo atrás, existiu uma menina que tinha muito medo da noite. Tanto medo que, assim que o sol começava a se pôr e as primeiras estrelas surgiam no céu, ela se escondia dentro de casa, embaixo dos cobertores, para não ter que ver o céu negro pontilhado de estrelas, muito menos a lua, a jogar seus raios sobre o chão.
Ela tinha medo do céu negro e desconhecido; medo das estrelas, pontinhos estranhos de luz em algum lugar distante; medo da lua, de sua forma que mudava mas sempre se repetia, de sua luz pálida; sentia medo do frio escuro e saudades do calor do sol. Na floresta em que morava, quando era noite de lua nova, tudo ficava tão escuro que ela não poderia ver os montros se aproximando, e quando era noite de lua cheia, havia sombras criadas pela luz branca, que se moviam de forma assustadora, como fantasmas do chão.
Durante muito tempo a menina sentiu medo todas as noites, e todas as noites ela passou escondida em sua casa, no colo de sua mãe ou embaixo das cobertas. Até que um dia, ao sair cedo para brincar na praia, ela ficou assistindo ao sol nascer, e o viu subir, e viu todo o seu caminho pelo céu. E quando ele estava prestes a se pôr, ela percebeu que, se ele estava sumindo dali, ele devia estar indo para um outro lugar, um lugar em que seria sol quando na casa dela fosse noite. E ela teve uma ideia: "Se eu seguisse o sol, seguisse ele sempre, para aonde quer que ele fosse, então nunca mais seria noite, e eu nunca mais teria que ficar em um lugar com aquele céu escuro e aquelas luzes sombrias".
Naquela noite, deitada no colo de sua mãe, ela perguntou para aonde o sol ia quando se punha. A mãe disse que ele ia para uma outra terra, um outro país, que ninguém ali conhecia. A menina então perguntou como se fazia para seguir o sol, mas a mãe riu, dizendo que era impossível: o sol andava muito mais rápido do que qualquer pessoa, do que qualquer animal, do que qualquer coisa aqui na terra. Mas a menina não se importou.
"Se eu andar bem rápido" - pensou - "tenho certeza de que conseguiria seguir o sol até qualquer lugar em que ele fosse".
Pensando nisso, ela arrumou suas coisas e, logo que o dia começou a clarear, sem que ninguém a visse, saiu de casa e começou a andar para dentro da floresta, na direção oposta à que o sol nascia.
No início ainda estava muito escuro, mas ela não sentiu medo, pois sabia que o sol estava logo atrás dela. Aos poucos, começou a clarear. Quando era meio-dia, o sol chegou ao ponto mais alto no céu, e não havia mais nenhuma sombra. Ela ficou feliz, pois gostava da luz; mas então percebeu, muito triste, que o sol estava andando muito mais rápido do que ela. Daquele jeito, ela estaria no meio da floresta, sozinha, quando a noite chegasse. Muito triste, e assustada com a ideia de estar sozinha quando a luz se fosse, ela voltou correndo para casa.
Os dias seguintes ela passou pensando em formas de seguir o sol. "Talvez", pensou, "se eu for de bicicleta, eu consiga andar tão rápido quanto ele". Assim, muito cedo em uma manhã, ela pegou novamente suas coisas, subiu na bicicleta e seguiu, o mais depressa possível, na direção oposta à que o sol nascia.
Dessa vez, quando o sol chegou ao seu ponto mais alto no céu, ela estava muito mais longe de casa. Mas se ele chegara até ali, queria dizer que ainda estava indo muito mais rápido do que ela; caso contrário, ele nunca deveria mudar de posição no céu. Desolada por sua segunda tentativa não ter dado certo, ela voltou novamente para casa.
Mais dias se passaram, e ela não conseguia descobrir uma forma de andar mais rápido do que o sol. Precisava de algo que a fizesse ir muito mais rápido do que a pé ou de bicicleta, mas não conhecia nada que fosse rápido assim. Talvez sua mãe estivesse certa; talvez fosse impossível seguir o sol. Talvez o destino dela fosse ter que suportar as noites, com suas sombras assustadoras, com seus barulhos fantasmagóricos.
Um dia, surgiu ali um viajante. Veio andando pela praia, usando um terno marrom e carregando uma grande mala. Parou à porta da casa dela pedindo água, e enquanto sua mãe o atendia, ela começou a conversar com ele.
"Qual é o seu nome?"
"Eu não tenho um nome"
"E o que tem na sua mala?"
"Muitas coisas"
"E de onde você vem?"
"De muito longe"
Era a primeira vez que ela conhecia alguém sem nome e que vinha de muito longe, então começou a contar sua vida para ele, quem era ela e como queria poder seguir o sol, para que nunca mais fosse noite. Contou sobre suas tentativas de seguir o sol, e como percebera que aquilo era impossível.
"Mas não é impossível", ele disse. "Eu tenho algo que pode fazer você andar tão rápido quanto o sol". E abriu a mala, tirando de dentro dela um grande balão.
A menina nunca tinha visto um balão, e não sabia para que servia aquilo. O viajante explicou que as pessoas podiam entrar na cestinha presa ao balão, e ao enchê-lo de gás, ele voava, levando as pessoas para o céu. E que lá no céu ele andava muito mais rápido do que qualquer coisa na terra, e podia seguir o sol.
"E lá no céu", ele disse, "dizem que existe um lugar em que o sol nunca se põe, e você não precisaria nunca mais fugir da noite. Se você quiser, eu te dou o meu balão, para que você vá procurar esse lugar".
Muito feliz, a menina aceitou. Guardou o balão dentro de casa, e no dia seguinte, bem cedo, o levou para a praia. Entrou na cestinha e o encheu de gás, como o viajante a ensinara. Quando a manhã já estava clara, o balão começou a subir.
Ele subiu e subiu, cada vez mais alto. Quando chegou acima das nuvens, ele começou a andar na mesma direção que o sol. No início ia devagar, mas depois começou a ficar cada vez mais rápido, até que o sol parou de se mexer no céu, ficando sempre na mesma distância atrás dele. A menina percebeu que agora estava andando tão rápido quanto o sol, e que nunca mais seria noite; e nunca na sua vida ela se sentira tão feliz.
Passou-se muito tempo, muitos e muitos dias, mas para a menina aquele tempo todo fora um único grande dia sem noite. Até que ela avistou, no horizonte, saindo de uma nuvem, uma escada que subia pelo céu. Ela parou o balão ao lado da escada e desceu da cestinha, pisando no primeiro degrau. Olhou para cima: a escada parecia não ter fim, subindo sempre para o céu. Ela começou a subir, degrau por degrau.
Ela subiu por muito tempo, por dias e dias, mas estranhamente, nunca ficava de noite. O sol se movia no céu até sumir, mas nunca escurecia: sempre havia uma luz vinda de algum lugar, uma luz tão clara e brilhante quanto a luz do sol. E a menina subia e subia, em direção ao topo do céu.
Depois de muitos e muitos dias, a menina avistou o fim da escada. O último degrau dava para um grande terraço cujo chão era dourado como o sol. Ela chegou até ali e começou a andar pelo terraço. No início não havia nada, apenas o chão dourado para todos o lados que ela olhasse, e o céu sempre azul acima dela. Ela andou e andou até avistar, ao longe, um grande castelo dourado. Correu para lá e, quando chegou, viu que ali havia pessoas, muitas pessoas, e todas também eram douradas e usavam roupas douradas. Quando ela chegou às portas do castelo, uma mulher que usava um vestido dourado foi até ela, e a pegou pela mão, e a levou para dentro. E no castelo a menina ganhou roupas douradas e sapatos dourados, e uma coroa dourada, e tudo nela brilhava tanto que ela começou a brilhar também. E quando ela já estava brilhando tanto quanto as outras pessoas naquela cidade, ela pôde sair do castelo e se juntar aos outros.
Muitos dias se passaram, e a menina vivia muito feliz na cidade em que nunca era noite. Porém, com o tempo, ela começou a sentir saudades de sua mãe, e das coisas que existiam abaixo das nuvens. Disse isso para as pessoas no castelo, e elas lhe disseram que, se quisesse, poderia ver as pessoas no chão, através do grande lago dourado que havia no castelo.
"Porém", as pessoas disseram, "o tempo lá embaixo passa muito mais rápido do que aqui. Talvez nada do que você conheceu ainda exista".
A menina foi até o lago, mas quando olhou para baixo não conseguiu encontrar sua mãe. Onde antes ela morava tudo estava diferente: havia outras casas, outras pessoas. Havia menos árvores e mais prédios, e até as roupas das pessoas eram diferentes. Ela procurou o cemitério da cidade, e encontrou lá o túmulo de sua mãe.
"Que triste é viver em um dia eterno", ela disse, "se todos que importam para nós têm que enfrentar a escuridão. Que triste é viver para sempre, se vivemos sozinhos!".
E quando disse isso, percebeu que o castelo dourado na verdade era uma prisão, que suas roupas douradas serviam apenas para afasta-la do que realmente amava, e que as pessoas douradas eram apenas pessoas que haviam fugido do que era real. E ela correu para fora do castelo, até o fim do terraço, e de lá se jogou. E começou a cair e cair, e enquanto caía seu vestido dourado se desfez, e o dourado de sua pele se desfez, e ela evaporara muito antes de chegar ao chão.