terça-feira, 6 de outubro de 2009

[conto #018] A Luta

A LUTA

Seria aquela a luta do ano. A sua luta. A batalha que definiria sua vida.
Sozinho no quarto, ele ensaiava, diante do espelho. Praticava contra si mesmo os golpes impiedosos que daria no outro. Repetia para seu reflexo as palavras de agradecimento ao público. Sobre um pódio imaginário, agradecia aos aplausos de uma platéia invisível.
Chegou o dia, afinal, do grande combate. O ringue o esperava, palco para seu glorioso espetáculo. A platéia gritava, em êxtase. Ele adentrou o campo de batalha e preparou-se para sua glória.
O outro entrou também. Suando frio. Sabia que não tinha chances. Sorriu com pena de seu pobre adversário, cuja derrota estava decidida muito antes de a luta ter começado.
Soa o sinal para o começo. Os dois em posição, se olhando. Ele, com um sorriso, embrigado pelo cheiro da vitória. O outro, com uma triste centelha de esperança em seu olhar.
Antes que haja o primeiro golpe, ele sente o golpe em seu peito, e desaba. O ar lhe falta. Tudo escurece.
Sofrera uma parada cardíaca. Estava morto antes de chegar ao hospital. Agradecendo aos fantasmagóricos aplausos de algum outro mundo.


SOBRE A HISTÓRIA

Mais um conto baseado nos contos do livro Contos de Amor Rasgado, de Marina Colasanti. Adoro escrever contos fantásticos curtos, principalmente com narrações como essa, que dão um ar meio surreal ao conto - mesmo este não tendo nenhum surrealismo propriamente dito. Tive a inspiração para escrever esse conto enquanto assistia a um filme sobre lutadores de boxe, absolutamente desinteressante.