O FILHO DO VENTO
O vento a perseguia por mais que ela corresse. Podia vê-lo ao olhar para trás, podia senti-lo ao respirar. Os braços dele quase a enlaçavam, mas ela se desvencilhava e corria mais, sempre mais, sempre fugindo, sempre.
De repente um obstáculo, uma pedra no caminho, e a queda direta ao chão. Sequer tocara o solo e já era envolvida pelo sopro frio, pela cortante paixão não correspondida. Debateu-se e gritou, mas o vento arrancou suas roupas, entrou por sua boca, invadiu seu corpo, enroscou-se por toda ela como se aquela agonia fosse a fonte de seu próprio prazer. E afinal cessou, desaparecendo, deixando no chão apenas um corpo inconsciente e desamparado.
Quando ela acordou, no dia seguinte, descobriu que dera a luz a um filho, que jazia no chão, aos prantos. Acalentou-o, beijou-o, mas não podia ama-lo sem odia-lo, pela lembrança que lhe trazia. A criança era metade ela, e metade vento; seu ser quase etéreo ora se desfazia quase por completo, ora era sólido como tudo o que há no mundo.
Atormentada, ela correu com o filho até o penhasco no fim do mundo, e ali jogou-se, com ele nos braços. Mas antes de chegar ao chão a criança desfez-se em ar, em brisa, em algo mais suave do que o vento, e envolveu a mãe em um abraço tão apertado que seu corpo se partiu e se desintegrou. O filho soprou suave as partículas do corpo da mãe, a fazendo cair como pó sobre todo o Mar que havia no fim do mundo, fecundando as águas com sua própria essência. E então, quando não havia mais nada de sua mãe nele, ele se misturou a seu pai, e os dois se tornaram um novo ser, um ser que era ora ar, ora vento; ora calmaria, ora tempestade; ora amor, ora paixão.
Nas areias da praia, confuso e sozinho, o homem, o único homem de toda a Terra, viu o mar agitar-se por um motivo que ele não podia ver e então novamente se acalmar; e então, de suas ondas, algo se ergueu e aos poucos tomou forma, uma forma que ele nunca vira, como não havia igual no mundo. A forma de uma mulher.
Não havia, nas terras do fim do mundo, outro ser semelhante ao homem, porque ele não pertencia àquele lugar. Todos os outros seres tinham um par, mas não ele; era sozinho. E então surgiu a mulher e saiu do mar, e ele entendeu que ela era como ele, era aquilo que faria com que ele não fosse mais sozinho.
Ela saiu do mar lentamente, como se receasse deixar para trás a matéria de que fora feita; mas ao ver o homem, foi até ele sem receio. Ele com medo, mas decidido a protege-la; ela compreensiva, disposta a se deixar proteger, mesmo que isso não fosse necessário. E eles tomaram para si as terras do fim do mundo.