terça-feira, 23 de setembro de 2008

[conto #004] Princesa, Anjos, Lua

PRINCESA, ANJOS, LUA

Um anjo nasceu no meio daquela estrela. Era a estrela mais alta e mais brilhante do céu. Dela, o anjo saiu. Pequeno e sem asas, escorregou até a lua e lá se sentou, olhando a Terra. Ficou muito tempo olhando, mas lá todos eram iguais, e ninguém era como ele. E ele disse:
-- Por que estou aqui?
Na lua morava uma linda rainha, que todos chamavam de Mãe. E Mãe foi até o anjo e o pegou no colo e disse, com uma voz celeste:
-- Você é um anjo sem asas; do céu nasceu mas no chão ficará.
-- Por quê?
-- Porque, lá embaixo, uma princesinha surgirá. E ela esperará por você.
-- Mas onde ela está?
-- Ela ainda não nasceu, porque você ainda é pequeno. Quando você percorrer a metade do seu quinto ano, ela nascerá.
E Mãe contou uma longa história ao anjo. Contou que ele nascera para cuidar da princesinha, e que ele seria a luz que a guiaria. Contou que a princesinha o amaria acima de tudo, e que ele também iria amá-la.
Contou que na Terra havia muitas princesas, e que ele podia amá-las também.
Mas também havia muitos anjos, e a princesinha não poderia amá-los.
-- Porque – contou a Mãe – se a princesinha amar outro anjo, começará a se esquecer de você. E se outro anjo se tornar o anjo da princesinha, você deixará de existir.
Porque o anjo só existia para cuidar da princesinha.
E o anjo desceu para o chão, e lá esperou. E muitas luas passaram e muitas estrelas surgiram, e o anjo esperava. E o anjo crescia, e verões passavam.
E no meio do quinto verão que o anjo via na Terra, nasceu a princesinha.
Foi na vigésima segunda hora do segundo dia do segundo mês. Um choro de menina acordou o anjo de um sono profundo.
-- Mãe! Mãe! - chamou o anjo, assustado – Quem chora?
-- É a sua princesinha. - disse a Mãe, da lua – Ela acabou de chegar. Vá vê-la.
Então o anjo entrou no castelo, e lá encontrou sua princesinha. Pequena e com brilhos de lua, em um berço dourado de sol. E eles passaram a se amar.
Princesinha cresceu, e não havia nada que ela amasse mais do que seu anjo sem asas. Os dois brincavam juntos pelo mundo, e o anjo cuidava da princesinha e lhe contava histórias do Céu e da Terra. E os dois cresciam.
Mas um dia o anjo conheceu outras princesas, e as amou. E lágrimas caíram dos olhos prateados da princesinha, porque ela nunca amara outro anjo. E ela perguntou ao seu anjo sem asas:
-- Por que você me traiu?
-- Não traí você, disse o anjo, apenas quero conhecer o mundo.
-- Podemos conhecê-lo juntos.
-- Mas você não pode ir comigo para o outro lado, porque é uma princesa e aqui é seu reino.
E o anjo atravessou o mar, ao encontro de novas princesas.
Princesinha chorou sozinha, por achar que seu anjo não a amava mais.
Passaram-se sóis e luas, e muitos verões. Princesinha cresceu, cresceram os jardins do palácio. Andando por eles, princesinha encontrou um anjo azul.
-- Brinca comigo, ela pediu. E ele atendeu.
E o anjo azul passou a brincar todos os dias com a princesinha. E a cada dia que passava ele roubava um pedacinho de seu coração.
Chegou o dia em que a princesinha passou a amar o anjo azul, seu coração se esquecendo aos poucos do anjo sem asas.
Do outro lado do mundo, cercado de outras princesas, o anjo sem asas sentiu seu coração começar a se desfazer, porque outro anjo estava se tornando o anjo da princesinha. E ele chorou, porque ainda a amava mais do que tudo.
-- Mãe – ele chamou – minha princesinha está deixando de me amar. O que faço?
-- Volte para junto dela, disse a Mãe, porque ela ainda se lembra de você. Mas, se ela o esquecer, você se desfará.
O anjo foi para o mar, reencontrar sua princesinha. Mas ela, nos distantes jardins de seu palácio, esquecia o anjo sem asas e amava o anjo azul cada vez mais.
E o anjo sem asas se desfazia, e perdia as forças. As ondas do mar o afogavam, e ele era levado pela correnteza. Chorando por sua princesinha perdida.
Um dia, quando princesinha brincava à beira do mar com o anjo azul, uma onda trouxe um anjo sem asas. Ele era quase como areia, invisível, e se desfazia com o vento. Princesinha o viu, e reconheceu aquele que fora seu anjo.
-- Anjo, ela disse, o que aconteceu com você?
-- Estou morrendo, disse o anjo triste, porque você não me ama mais.
-- Não! Eu te amo ainda, e não te esqueci!
Mas o anjo azul se aproximou, e disse:
-- Mas você também me ama agora, porque ele não soube te amar, e te abandonou. Deixe-o se desfazer.
-- Não posso! - disse a princesinha, com lágrimas nos olhos. Porque ela não podia perder alguém que tanto amara.
Quando tudo parecia perdido, a lua surgiu no céu de estrelas. Sobre um cavalo de prata, Mãe desceu para a Terra, indo pousar naquela praia, ao lado da princesinha e dos dois anjos que ela amava.
-- Mãe... - disse o anjo sem asas – Eu vou morrer?
Mãe desceu de seu cavalo. Beijou princesinha, dizendo:
-- Ouvi seu coraçãozinho chorando, e vim te ajudar.
-- Mãe, por favor, salve o meu anjo, porque eu o amo. Fui má por amar dois anjos, e ele foi mau por amar outras princesas. Mas todos nós somos crianças, e as crianças sempre têm perdão.
-- Vocês não foram maus. Só esqueceram de que são responsáveis por quem os ama. Nunca mais se esqueçam disso.
Então Mãe pegou o anjo sem asas no colo, e cantou uma canção para ele; e uma luz surgiu de dentro dele, e iluminou o mundo.
Quando a luz se dissipou, o anjo se transformara. Seu corpo era agora da cor dos olhos da princesinha, e era a mesma cor da lua e do céu. E agora ele tinha asas, grandes asas prateadas, e delas caía o pó das estrelas.
-- Meu anjo, como você se tornou lindo. - disse a princesinha.
-- Me tornei assim por você, ele disse, e a abraçou.
-- Agora, disse a mãe, você é um anjo do céu, e no céu ficará. E de lá sempre olhará por sua princesinha. E ela ficará aqui na Terra, com o anjo azul.
O anjo beijou princesinha, e voou de volta para a estrela mais alta e mais brilhante do céu. Atrás dele restou uma trilha prateada, que nunca se desfez.
Na Terra, agora, a princesinha vive com o anjo azul. E, no céu, o seu anjo olha para ela, e a ama e a protege.
Eternamente.


SOBRE A HISTÓRIA

Esse conto foi quase todo escrito durante uma aula de Geometria Analítica (!!!). Começou inspirado em contos de fadas e em algumas pessoas que conheço, mas acabou seguindo um rumo totalmente diferente. Uma pequena homenagem a amigos de vários tempos e a mim mesma. Foi a primeira história com temática infantil (ou conto de fadas) que escrevi.

Um comentário:

HugoBenjamim disse...

Ok... este conto...
Nem sei se posso comentar para nao me comprometer! :p

Acho que tenho que encontrar minha princesinha... e não estou estou a procura de várias... só aquela mesmo!

Mas é um conto engraçado e muito cheio de fantasia...
Você é uma romântica que sonha acordada, não?! ;)

Bem...beijão