segunda-feira, 6 de outubro de 2008

[conto #005] Sobre o Mar

SOBRE O MAR

Ele estava me esperando no lugar de sempre. Tinha os olhos perdidos sobre o mar e nenhuma expressão em seu rosto. O dia estava da cor do gelo.
-- Demorei?
-- Não.
Silêncio, não fosse as ondas abaixo de nós. Eu queria dizer algo, mas tinha medo. Sabia porquê estávamos ali.
-- Eu...
Mas ele fez um sinal para que eu me calasse.
Quanto tempo passamos ali, eu e ele, em silêncio? Dez, quinze, vinte minutos. Mas pareceu uma vida. Sei que a areia era branca e a água do mar era dourada e azul. Sei que havia apenas as nossas pegadas na areia. Sei que me lembrei.
Lembrei... Lembrei de tudo, desde que o conheci. Nós dois tão sozinhos, e estava tão frio. A noite era escura. Ele me tomou em seus braços e me mostrou o mundo.
E agora, o silêncio.
-- Você sabe por que eu te chamei?
Balancei a cabeça. “Não”. Mas é claro que eu sabia.
-- Eu gosto muito de você. Você sabe disso. Mas você também sabe que isso não pode continuar.
Agora, o silêncio vinha de mim.
-- Não pode, entende? Não é certo. Isso tem que acabar.
Quando eu falei, minha voz era uma onda de tristeza e lágrimas.
-- Você quer terminar tudo comigo?
-- Não quero. Mas preciso.
Também havia lágrimas na voz dele, mas elas eram cristalinas. As minhas eram pesadas e negras.
Chorei com a cabeça baixa, o rosto oculto em minhas mãos. Sabia que ele estava fazendo o que era certo. Sabia também que ele nunca mais me acolheria em seus braços. Nunca mais me consolaria. O desespero fluiu para minha garganta.
-- Você é o homem da minha vida.
Não queria ter dito aquilo, não queria tornar tudo mais difícil. Mas era impossível controlar minha tristeza, e ele compreendeu.
-- Você também. - senti ele tocar meus cabelos carinhosamente, como fizera tantas vezes antes – Você também é o homem da minha vida.
Continuei chorando, mas minhas lágrimas foram diminuindo conforme ele tocava minha cabeça, meu pescoço, meus ombros. Foi a última vez que senti aquele toque.
-- Eu te amo.
Três palavras que pareciam tão límpidas vindas dele. Eu conseguir erguer o rosto e olhá-lo novamente. Também havia lágrimas em sua face.
-- Eu também te amo.
-- Mas não pode ser. Você sabe.
-- Eu sei.
Demos nosso último abraço, nosso último beijo. Ele se foi, e eu continuei sentado na areia, desejando mergulhar para sempre no mar. Mas não o fiz.
Nós tínhamos doze anos.


SOBRE A HISTÓRIA

Essa história não ficou tão boa quanto eu achei que ficaria, mas decidi publicá-la mesmo assim. A escrevi em homenagem a dois garotinhos muito especiais, que não vejo há algum tempo, mas dos quais tão cedo não me esquecerei. E as falas foram baseadas em uma conversa que eu mesma tive com um garoto, aos nove anos.

Um comentário:

HugoBenjamim disse...

Acho que ficaram muitos pontos de interrogação com essa história!

Eu gosto de encontrar as respostas para tudo porque, se não encontrar a resposta, eu adopto a culpa!

Eu sei que é errado! Mas eu sou assim!