CAPÍTULO 3
No sábado à noite, Bono foi me buscar em casa.
Eu tinha passado o dia todo me arrumando, com a ajuda de uma dúzia de amigas, e o resultado foi espantoso. Quando me olhei no espelho, não me reconheci. Eu estava linda. E quase parecendo ter a idade que eu tinha.
Bono ficou sem palavras quando me viu. Seus olhos me percorreram de cima a baixo, e ele abriu a boca para falar, mas as palavras não saíram. Senti um orgulho inédito, e disse, sorrindo:
-- Olá.
-- Oi. - ele conseguiu murmurar – Você está muito... Digo, você... Eu nunca te vi tão... Bonita.
-- Obrigada. Você também está muito bonito.
E ele estava. Estava lindo como nunca, perfeito.
Nós fomos para a festa. A mansão já estava lotada. Nunca imaginei que veria tantos artistas reunidos, mas ali estavam eles. E eu no meio daquilo tudo, de braços dados com Bono, circulando pelo salão.
Percebi que muitos me olhavam, principalmente homens, e me agarrei com mais força ao braço de Bono. Ele também percebera, e parecia gostar de me exibir para os outros: quanto mais me olhavam, mais orgulhoso ficava.
-- Guggi! - ele disse, quando encontrou seu amigo – Bela festa, amigo!
-- Olá, Bono! Obrigado pelo elogio. E que lindo anjo é esse? - ele beijou minha mão – Bem novinha. Você sempre dá sorte com elas.
-- É amiga da minha filha, Guggi.
-- Oh, claro... Encantado, senhorita.
Sorri, mas estava pouco à vontade. Eu era uma estranha ali, uma criança tentando parecer adulta. Depois que Bono começou a beber, as coisas pioraram: outras pessoas atraíram sua atenção, e ele acabou me deixando sozinha.
Acabei indo para a varanda. As coisas não estavam saindo do jeito que eu imaginara. Festa com o Bono não era assim tão divertido: depois que ele encontrara os amigos, esquecera-se completamente de mim.
Devo ter ficado mais de meia hora sentada na varanda, olhando a lua. Inesperadamente, ouvi Bono dizer:
-- Está gostando da festa?
Me virei; ele estava sentado ao meu lado, muito perto de mim. Senti meu coração disparar.
-- Sim.
-- Você parece triste...
-- Ah, não... Só estou... Pensando.
-- Não pense. - ele me entregou um copo – Beba isso, vai te deixar mais solta.
Bebi, fosse o que fosse aquilo. Realmente me deixou mais leve. E queimava. Murmurei:
-- Esquenta...
-- Logo você acostuma. Vem – ele me pegou pela mão – vamos dar uma volta.
Fomos andar pelo jardim. Eu já tinha percebido, pelo modo como ele falava, que Bono estava bêbado, mas isso não era nenhuma novidade pra mim. Já o vira assim várias vezes, e ele sempre parecera totalmente inofensivo.
Nos sentamos em um banco sob uma árvore, e ficamos calados, olhando o céu. Eu senti ele olhar pra mim, mas não me virei. Ele tocou meus cabelos, mas continuei olhando a lua. Eu estava nervosa, tremendo por dentro. Então ele murmurou:
-- Você tem seios lindos.
Devo ter ficado cor-de-rosa. Me virei para ele, um pouco assustada, mas ele apenas sorriu, como se tivesse acabado de elogiar meus olhos. Talvez não tivesse a mínima ideia do que estava falando.
Eu ia dizer para que ele parasse com aquilo, que não falasse aquelas coisas; mas, quando abri a boca, o que saiu foi:
-- Canta pra mim?
Ele riu. Riu de verdade.
-- Que música?
-- All I Want is You.
-- Gosta dessa?
-- É uma das que mais gosto.
Cheguei mais perto, e ele passou as mãos pelos meus cabelos, começando a cantar suavemente:
-- You say you want...
Fechei os olhos e apoiei a cabeça no ombro dele. Era a primeira vez que eu sentia, naquela noite, que era realmente Bono quem estava ao meu lado. Bono, o mesmo que eu via todas as noites em clipes e shows na televisão. Bono, o mesmo que milhares de garotas dariam tudo para tocar. Bono.
-- All the promises we made...
Embora eu tivesse conhecido a pessoa antes do artista, o lado rock star do Bono logo me fascinara. Porque, mesmo em casa ou com os amigos, Bono quase nunca era Paul Hewson. Bono era Bono.
E era Bono que estava ali, abraçado a mim, no jardim ao luar. Cantando para mim, com os lábios encostados em meu ouvido.
-- When all I want is you...
Quando a música acabou, ele ficou murmurando a melodia em meu ouvido, suavemente. Permaneci de olhos fechados, saboreando aquele momento por mais alguns instantes. Quando abri os olhos, Bono olhava para mim.
-- Gostou?
-- Sim.
Ele passou a mão em meu rosto, olhando para os meus olhos, minha boca. Estávamos tão perto que eu podia sentir o calor emanando dele, o ar de sua respiração. Murmurei:
-- Eu...
Mas ele tocou minha boca, num sinal para que eu me calasse. Estávamos agora tão próximos que eu podia ver cada detalhe em sua pele muito branca, cada leve sarda em seu rosto, a pequena cicatriz no queixo, os lábios finos, os olhos tão azuis...
-- Bono!
Levamos um susto, nós dois. Bono me soltou tão depressa que quase caí. Fora Adam quem chamara; ele estava parado a alguns metros, e acenava para Bono.
-- Bono! Vem cá! Eu estava te procurando!
Não sei se Adam percebera o que estava acontecendo, mas parecia totalmente inocente. Bono se levantou, falando:
-- Já vou! - ele se virou para mim e baixou a voz – Me espere aqui, eu já volto.
E ele foi.
Fiquei lá, obediente, por muito tempo. Devia ter se passado mais de uma hora quando desisti de esperar. Era tolice, Bono não voltaria. Devia ter encontrado algo mais divertido, talvez nem se lembrasse do que acontecera. Quem acredita nas promessas de um bêbado? Levantei-me e voltei para a festa.
Avistei Guggi, e me aproximei.
-- Guggi, você viu o Bono?
-- Não, querida. Mas é só procurar a maior concentração de mulheres, e vai encontrá-lo. Tome, beba um Martini. - ele me estendeu um copo – Já são duas horas e você ainda está sóbria, temos que dar um jeito nisso!
Ele riu. Eu acabei bebendo. Fui procurar o Bono; o encontrei, sentado num sofá, com três mulheres em volta e uma em seu colo. Tive vontade de chorar, mas me controlei; peguei mais um copo e bebi tudo de uma só vez. Talvez, se eu estivesse bêbada, ele olhasse para mim.
-- Nem adianta. - disse Adam, que se aproximara – Ele está muito ocupado agora.
-- Estou vendo.
-- Ele te deixou sozinha?
-- Deixou. Ele me pediu pra esperar, mas... Pelo jeito, encontrou coisas mais interessantes.
Fui para a varanda, e Adam veio atrás de mim. Peguei mais um copo de uísque, e fiquei apoiada na mureta, olhando o jardim. Adam se sentou ao meu lado e disse:
-- Olha, não fique chateada. Ele é assim mesmo. Mas isso não quer dizer que ele não goste de você, é só que... - ele acendeu um cigarro – Os homens fazem coisas estúpidas quando estão bêbados.
Tentei falar e me virar ao mesmo tempo, perdi o equilíbrio, quase caí; Adam me segurou a tempo. Olhei para ele pela primeira vez naquela noite: ele era alto, muito maior do que Bono, e seus olhos eram muito azuis. Eu nunca o achara bonito, muito pelo contrário; mas, naquela hora, seus olhos brilhavam como estrelas. E eu estava tão sozinha. Me segurei na camisa dele e encostei a cabeça em seu peito, murmurando:
-- Adam...
Ele passou a mão pelos meus cabelos.
-- Você está bem?
-- Não sei.
-- Você bebeu demais. É melhor ir lá pra cima.
Adam me levou para um dos quartos. Sentei na cama, me sentindo confusa: já não sabia quem eu era ou o que estava fazendo ali. Quando consegui pensar novamente, Adam estava ao meu lado, me abraçando pelos ombros, e me olhando intensamente.
Ao contrário de Bono e Edge, Adam não me vira crescer. E era solteiro. Por isso, não estranhei suas intenções, embora a idéia de passar a noite com ele não me fosse muito aprazível. Era Bono quem eu queria, e ninguém mais.
Mas Adam tinha qualidades apreciáveis. Era gentil, e muito carinhoso. Bem diferente do que eu imaginava antes de conhecê-lo.
-- Você se sente melhor?
-- Um pouco... Tonta...
-- Você não deve beber tanto. Quer deitar um pouco?
-- Não, eu... Eu quero... Eu não sei o que quero...
Comecei a chorar. Ele me abraçou, me consolando. Não sei quanto tempo se passou; uma hora tudo sumiu, e no instante seguinte Adam estava com o rosto mergulhado em meus cabelos, murmurando coisas em meu ouvido. Eu não entendia, apenas absorvia a idéia de suas palavras, e sabia que não devia aceitá-la. Murmurei:
-- Não...
Ele se afastou, mas em seguida tentou me beijar. Sem ser insistente, sequer deselegante. Apenas fez uma última tentativa de se aproximar de mim. Quase aceitei, mas no último instante eu disse “não”, e ele me respeitou.
Era o segundo membro do U2 que eu quase beijava naquela noite. E eu não sabia se isso era bom ou ruim.
-- Desculpe. - disse ele.
-- Tudo bem. - olhei em seus olhos – Obrigada por cuidar de mim.
Adam sorriu ternamente. Imagino que tenha ficado um pouco frustrado por não ter conseguido o que queria, mas ele não demonstrou. Pelo contrário, continuava gentil e atencioso.
-- Você quer que eu chame o Bono?
-- Ele estava ocupado... Com outras pessoas...
-- Pois eu vou dar uma bronca nele por ter te deixado sozinha. - ele se levantou – Não saia daqui. Descanse um pouco, vai te fazer bem. Garanto que o Bono chega em um minuto.
Fiquei novamente sozinha. Estava começando a achar que aquela era a pior noite da minha vida. Para piorar, a mistura de bebidas começava a me deixar enjoada. Me encolhi na cama e comecei a chorar, agarrada a um travesseiro.
Vinte minutos depois, Bono chegou. Bateu de leve na porta e entrou, chamando meu nome. Continuei chorando, com o rosto enterrado no travesseiro. Bono veio até mim, mas não olhei para ele, nem quando ele disse:
-- Querida... Meu anjo, me desculpe...
Continuei chorando. Bono se sentou na cama. Apesar de bêbado, o remorso dele era real.
-- Oh, querida... - ele tocou bem de leve no meu cabelo, como se receasse um contato maior – Não chore... Quando o Adam disse que você estava sozinha aqui, eu me senti tão culpado... Sei que não devia ter te deixado sozinha...
Olhei para ele. Parecia realmente arrependido.
-- Foi o Adam quem me trouxe pra cá. Eu tinha bebido muito, e ele disse que aqui eu ficaria melhor.
-- Ele me falou. Sei o que deve estar pensando, ele é muito melhor do que eu, muito mais responsável...
-- Ele tentou me beijar.
Nunca teria dito aquilo no meu estado normal, mas eu estava bêbada. Bono olhou para mim boquiaberto.
-- Ah, aquele... Ele não fez... Nada demais, fez?
-- Não. Eu não quis.
Agora a expressão dele era de alívio.
-- Oh, muito bem. Isso, querida, estou orgulhoso de você. Aquele velho tarado, será que ele não sabe que você ainda é uma menininha...
-- Bono...
-- O que?
-- Você também quis me beijar, lembra? Lá no jardim.
A princípio ele pareceu surpreso, mas então sua expressão mudou completamente, e ele sorriu. Disse, passando a mão pelo meu rosto:
-- O céu estava lindo, não estava? Quer que eu cante outra música pra você?
Baixei os olhos. Então era assim? Ele me largava, ficava dando em cima de todas as mulheres da festa, e depois voltava como se nada tivesse acontecido?
-- Já está tarde. Temos que ir.
-- Não vamos. Está cedo ainda, veja – ele apontou para a janela, de onde se via o céu – a noite está cheia de estrelas... Vamos terminar aquilo que começamos no jardim...
Eu não consegui mais resistir. E não suportaria um terceiro beijo frustrado naquela noite. Larguei o travesseiro e aceitei o abraço de Bono. Ele me segurou com força, mais até do que eu esperava – a bebida cortava um pouco seu lado romântico. E novamente senti aquele calor que emanava dele, aqueles olhos tão perto de mim.
Fechei os olhos, e senti aqueles lábios tocarem os meus, e era tão quente, tão macio. Abri a boca, e senti a língua dele passando pelos meus lábios, tocando a minha língua, me provando. Sentia calor e frio, perdi as forças – achei que fosse desmaiar ali, nos braços dele. Mas ele me segurava firme, e passava as mãos pelos meus cabelos; nós dois ajoelhados na cama, perdidos um no outro.
Tentei ser mais ativa: me abracei com mais força a ele e mergulhei a mão em seus cabelos. Ele estava tão quente. Ouvi ele suspirar, um meio-gemido, e quase dei um grito quando senti o volume em sua calça, algo sendo pressionado contra mim. Me afastei e disse:
-- O que é isso?
Era a coisa mais idiota que eu podia ter dito. Bono deu uma risada maliciosa e me empurrou para a cama, dizendo:
-- Quer ver?
Eu queria, ah, como eu queria. Mas havia um outro lado meu, que estava em pânico; e esse lado queria sair correndo dali.
Bono tomou meu silêncio como um consentimento, e desabotoou a calça. Eu disse:
-- Espera!
Segurei a mão dele, para que não continuasse. Ele estava surpreso.
-- O que foi?
Tentei dizer algo, mas não consegui. Bono sorriu com malícia, e me fez deitar de novo. Subiu em mim, dizendo:
-- Hum... Eu já sei. - ele beijou meu pescoço e sussurrou em meu ouvido – Não quer ver, não é? Gosta de fazer no escuro?
Ele apagou a luz. O quarto ficou às escuras, apenas iluminado pela claridade de fora.
-- Querida... - ele beijava meu pescoço, meu rosto, minha boca.
-- Bono... Bono, não... Espera...
-- Shh... Não precisa ter medo... Você está comigo, nada de mal vai te acontecer...
Suas mãos começaram a subir por dentro do meu vestido. Entrei em desespero: aquilo não podia acontecer. Não assim, com ele bêbado e eu em pânico.
-- Não! Não, eu não quero!
Mas ele não parava. Levantou o meu vestido, devagar, enquanto tocava meu seio com a outra mão. Quando ouvi o barulho de seu zíper sendo aberto, falei a única coisa que podia dizer para tentar impedí-lo:
-- Eu sou virgem!
Foi como se eu tivesse apertado o botão “desliga”. Bono parou imediatamente e olhou para mim.
-- Você está falando sério?
-- Sim.
Agora, eu desejava não ter dito. Bono se sentou na cama e acendeu a luz. Passou a mão pela cabeça, parecendo confuso. Eu arrumei o vestido, mas continuei deitada. Ele acendeu um cigarro e olhou o relógio, distraidamente.
-- Quatro e meia. Vamos embora.
Quatro e meia! Minha mãe ia me matar. Me levantei, e enquanto eu arrumava o cabelo ele terminou o cigarro. Depois, fomos embora.
No carro, o silêncio reinou durante todo o caminho. Eu estava constrangida demais para falar qualquer coisa, e ele parecia imerso em outro mundo. O carro parou em frente à minha casa, mas eu não me movi. Ele disse:
-- Tchau.
Ele estava me expulsando. Abri a porta, mas me voltei pra ele e disse:
-- Bono...
Antes que ele pudesse me impedir, eu o beijei. Ele aceitou, mas depois disse:
-- Você tem que ir.
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