terça-feira, 24 de setembro de 2013

[fanfic #008] [capítulo #004] [U2] Tão Perto, Tão Longe


TÃO PERTO, TÃO LONGE

CAPÍTULO 4

Logo no dia seguinte à festa, tive febre. Cheguei a delirar. Via as imagens da noite anterior se repetindo à minha frente, tive crises de choro, fiquei chamando por Bono.
Quando a febre passou, veio a depressão. Eu passava os dias na cama, cercada por pôsteres e revistas do U2. Ouvia todos os cd's milhares de vezes, lembrando daquela voz sussurrando em meu ouvido, cantando pra mim. Meu primo ficava na porta, me olhando. Eu fazia de tudo pra não ter que falar com ele, mas no quinto dia acordei com ele sentado à beira da minha cama. Ele tinha me encurralado.
-- O que ele fez com você?
-- Nada.
-- Mentira. - ele chegou bem perto – Ele te machucou? Te obrigou a fazer alguma coisa?
-- Não.
Ele suspirou. Era óbvio que não acreditava em mim.
-- Se você não responder, então vou perguntar pra ele. Vamos ver como ele vai se defender.
-- Não! - o segurei pelo braço – Eu conto.
Contei. Meu primo ouvia tudo em silêncio, e quando eu terminei ele disse:
-- Você não vai mais chegar perto desse cara.
-- Mas... Eu... Eu gosto dele... - baixei a cabeça – E acho que ele também gosta de mim...
-- Gosta? Homens como ele não gostam de ninguém. Um homem mais velho que seu pai não tentaria te levar pra cama se tivesse um mínimo de bom caráter. Ainda mais um homem casado, com quatro filhos.
-- Mas ele se preocupa comigo... Sempre foi tão carinhoso...
-- Não estou dizendo que ele não sinta nada. Ele te viu crescer, deve ter um certo carinho por você. Mas, agora, o que ele quer é sexo. Ele não tem nenhuma intenção de ter um relacionamento sério com você. Quer se divertir, só isso.
Baixei a cabeça. Ele estava certo.
-- Mas o que eu faço? Eu amo ele...
-- Não, você não ama. Olhe esses pôsteres, essas revistas. Isso não é amor, é uma fantasia. O homem que foi com você na festa, o homem que te beijou, não é o mesmo homem dessas fotos. Esse aqui – ele apontou uma foto de Bono – é só um personagem que ele incorpora quando sobe no palco. Assim que acaba o show ele tira esse personagem e volta pra vida dele. E nessa vida existe um casamento de vinte anos, quatro filhos, e mais um muro de coisas que te separam dele.
No fundo eu já sabia de tudo aquilo, mas, dito daquele jeito pelo meu primo, a realidade despencou à minha frente. Um muro que separava eu e Bono. Não, não era bem isso: a verdade é que o Bono não existia. Havia apenas Paul Hewson, e uma fantasia na qual eu vinha me agarrando há muito tempo. Meus olhos se encheram de lágrimas.
-- Eu sei que isso dói. - disse meu primo – Mas você tem que superar. Se quiser, pode continuar a sair com o Bono, levar isso adiante. Mas vai ser só uma fantasia, um sonho que uma hora acaba, e quanto mais você se envolver, mais vai sofrer quando terminar. Você não pode viver numa fantasia para sempre. - ele segurou minha mão – Se esquecer isso, se viver sua vida, vai ver que existem muitas pessoas aqui que gostam de você. Pessoas de verdade. Existem caras melhores, que te merecem, que te dão valor. Bono não merece suas lágrimas. Você merece um homem que te ame de verdade, que saiba te respeitar, que possa assumir um relacionamento com você. Se abrir os olhos, talvez encontre a pessoa certa bem mais perto do que você imagina.
Pensei um pouco, suspirei, engoli as lágrimas. Por fim, disse:
-- Você está certo. Eu... Eu tenho que esquecer ele.
-- Isso. - ele sorriu – Pense no que eu te falei. Hoje já é sexta, você vai ter o fim de semana todo para refletir. Eu não vou mais te pressionar, vou deixar que decida sozinha.
-- Certo.
E ele cumpriu a promessa. No resto do dia e no seguinte, não tocamos mais naquele assunto.

* * * * *

No domingo, eu me sentia muito melhor. Guardei minhas revistas do U2, diminuí o número de pôsteres na parede, coloquei um cd do Led Zeppellin pra tocar. Eu voltara a ser só uma fã normal.
À tarde, coloquei um short e uma camiseta – com estampa da Hello Kitty – e fui à padaria, de bicicleta. Quando eu atravessava a rua, um carro velho veio na toda para cima de mim. Tentei desviar, caí da bicicleta, bati no meio fio, e tudo ficou escuro.
Quando acordei, estava dentro de um carro parado, deitada no banco de trás. Um carro que eu conhecia. Olhei em volta, e vi Bono ao meu lado.
Me sentei depressa. Bono disse:
-- Calma. Você está bem?
-- Sim.
-- Não sente dor?
-- Não. - era mentira, eu estava toda dolorida – O que aconteceu?
-- Um carro quase te atropelou. Você desmaiou quando caiu na calçada.
-- E a bicicleta?
-- Já era. Ele passou por cima.
Senti um frio no estômago.
-- Ainda bem que eu caí, então.
-- Se não tivesse caído, eu teria uma visão nada agradável quando chegasse lá.
-- Peraí. Como foi que você me socorreu? O que você estava fazendo ali? E o cara que me atropelou, cadê?
-- O cara fugiu. Eu estava vindo logo atrás, vi tudo. Parei pra te socorrer.
Os descaminhos do destino. Eu tinha que rever Bono numa situação como essa? Toda machucada, descabelada, e usando uma blusinha da Hello Kitty?
-- Você está machucada. - disse ele, passando a mão no meu rosto – Mas acho que não bateu a cabeça. Vou te levar ao médico, só pra ter certeza.
-- Não vou ao médico!
-- Já está indo. - ele fez um sinal para o motorista, que ligou o carro – Enquanto isso, vamos conversar.
-- Não quero. - virei o rosto, subitamente me lembrando da festa e dos últimos dias – Não quero mais falar com você.
-- Mas vai. Por que não tem ido à escola? Jordan disse que você não foi essa semana.
-- Eu não estava me sentindo bem.
-- Por causa do que aconteceu na festa?
-- É, por isso! Pra você não foi nada, não é? Mas pra mim foi! Você me fez criar sonhos, esperanças, sabendo que nada daquilo era real! Você só queria se divertir!
Ele ficou calado por um tempo, antes de dizer:
-- Você está certa. Tive o pior comportamento que um homem pode ter. Agi errado, fui egoísta, irresponsável. Abusei de você, fisicamente e sentimentalmente.
-- Você não me... Abusou fisicamente.
-- Abusei. Te beijei, te toquei de uma forma que nunca deveria ter tocado. Estou pedindo desculpas, mas vou entender se você não as aceitar.
Eu não sabia mais o que pensar. Não estava esperando que ele assumisse seus erros daquela maneira. Ele continuou.
-- Vou ser sincero com você. Sei que você não é adulta, mas já tem idade para entender certas coisas. - ele se aproximou – Eu amo a Ali. De verdade. Talvez você não acredite, muitas pessoas não acreditam, porque eu não sou um marido exemplar. Traí ela algumas vezes, e não me orgulho disso, nem acho que tenho esse direito só por ser quem sou. - ele fez uma pausa, olhou pela janela – Eu amo a Ali. Ela é uma mulher maravilhosa, e eu não a mereço. A faço suportar coisas que mulher nenhuma deveria suportar.
-- E ela aceita isso?
-- Mais ou menos. Ela sabe muito bem quem eu sou e o que faço. Sei que ela me ama muito, para agüentar isso.
-- E se ela não agüentar? Se um dia você chegar em casa e descobrir que ela foi embora?
Bono ficou muito sério.
-- Se um dia ela me deixasse, eu não iria censurá-la. Mas tenho certeza de que não viveria mais um mês sem ela.
-- Credo, não diga isso...
-- Estou falando sério. A Ali é tudo pra mim. Ela e a banda são tudo pra mim. Se um dia eu perder um dos dois, vou me matar ou então definhar até morrer.
-- Mas o U2 não vai durar pra sempre.
-- Eu também não.
Senti um calafrio. Ficamos em silêncio durante o resto do caminho. O carro chegou no hospital, eu fiz os exames, alguns curativos e fui liberada. Logo que entramos de novo no carro, eu disse:
-- Por que você me disse aquelas coisas?
-- Por causa do que aconteceu entre a gente. Pra que você saiba quais são meus sentimentos. Não quero enganar você.
-- Você me falou do que sente pela Ali. Mas isso não explica o que aconteceu na festa. - baixei a cabeça – Aquela hora, no jardim... Foi a coisa mais linda que já me aconteceu. Muito mais do que o que aconteceu depois, no quarto.
Ele olhou para mim, e havia uma mal disfarçada preocupação em sua voz quando disse:
-- Não gostou do meu beijo?
-- Não! Digo, não é isso! Claro que gostei, foi o melhor beijo da minha vida, você beija muito bem... - ele sorriu, e eu estava muito vermelha – Mas não foi romântico. Eu tive medo. No jardim não, você foi gentil, carinhoso... Acho... Acho que, se naquela hora você tivesse ido adiante, eu não teria te impedido.
Bono passou a mão nos meus cabelos, carinhosamente.
-- Eu nunca teria me perdoado se tivesse acontecido alguma coisa.
-- Então, por que...
-- Eu estava bêbado. Jamais agiria daquela forma se estivesse sóbrio. Mal consigo me lembrar de algumas coisas.
-- Então, foi só isso? Só porque você estava bêbado?
-- Claro que não. Você é muito bonita, bebê. E cresceu muito rápido. – ele tocou meu rosto – Tenho que admitir que você é atraente. Mas não é por isso que vou perder a cabeça e fazer uma loucura. Você ainda é... É muito jovem, há coisas para as quais não está preparada.
-- Então, quando você me convidou para a festa, não tinha nenhuma intenção a mais?
-- Claro que não.
Se eu fosse um pouco mais experiente, não teria acreditado.
-- E o que vai ser agora?
-- Eu gostaria que nós esquecêssemos aquilo. Quero continuar a ter com você a mesma relação de antes. Você é uma menina adorável, nossas famílias se conhecem, você é amiga da minha filha. Eu não quero que o que aconteceu atrapalhe a nossa amizade.
-- Eu acho que assim é melhor. Andei pensando muito, e... Acho que o que eu sentia por você não era amor. Era uma... Fascinação. E eu quero que a gente continue a ser amigos, porque eu gosto muito de você.
-- Seremos. Continuaremos a nos ver, como se nada tivesse acontecido.
Ele me deixou em casa. Voltamos a nos ver nos dias seguintes, e as coisas voltaram a ser como antes. Como se nada tivesse acontecido.

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